Quando PJ Haarsma escreveu seu primeiro romance, uma história de ficção científica destinada aos pré-adolescentes, ele não pensou apenas em como descrever Orbis, o sistema solar em que a história transcorre. Também pensou em que aparência ele teria em um game. O jogo online criado por Haarsma não só amplia o mundo do romance mas permite que os leitores desempenhem um papel na história. Ao mesmo tempo, ele calculadamente deu aos adeptos de videogames que não costumam ler livros um incentivo claro para que o façam. Um dos caminhos para avançar no jogo é responder a perguntas sobre o livro.
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"Não se pode mais simplesmente escrever um livro", disse Haarsma, ex-consultor publicitário. Combinar um romance e um videogame, acrescentou, "leva o livro ao mundo deles, em lugar de tentar trazê-los ao mundo do livro". Haarsma não é o único autor que está usando games online ou videogames para despertar o interesse pelos livros. Cada vez mais, escritores, professores, bibliotecários e editores estão adotando esse mundo veloz e repleto de imagens na esperança de que os jogos convençam as crianças a ler mais.
Estimuladas pelo argumento de que PCs e videogames podem alfabetizar as crianças para o mundo digital, e que isso está se tornando tão importante quanto a capacidade de leitura, as bibliotecas estão organizando torneios de games e as escolas estudam como incorporá-los aos seus cursos.
A Fundação John D. and Catherine T. MacArthur, de Nova York, está apoiando os esforços para criar uma escola pública de acordo com uma proposta que se baseará em princípios do design de videogames, tais como resposta imediata e uso de recursos gráficos para promover o aprendizado.
As editoras enquanto isso correm para aproveitar a onda. A Scholastic, que publica os títulos da série Harry Potter nos Estados Unidos, recentemente lançou The Maze of Bones, primeiro título de uma série de mistério com dez livros que está vinculada a um jogo na web.
Antes do lançamento de Brisingr, o terceiro livro na série de best sellers de fantasia Inheritance, de Christopher Paolini, a Random House Children¿s Books encomendou um jogo online. Cerca de 51 mil pessoas se inscreveram para jogar desde junho.
Mas professores e especialistas em alfabetização, céticos quanto aos novos métodos, questionam a eficácia do uso de um meio primordialmente visual para conectar os jovens à palavra escrita. Sugerem que, embora alguns jogadores possam se sentir motivados a ler por conta de um jogo, muitos outros deixarão o texto de lado e se dedicarão apenas ao jogo. Outros ainda sugerem que os videogames perturbam a experiência de imersão completa em um livro.
Alguns pesquisadores, porém, dizem que embora a criança possa não ler muito texto, está adquirindo capacidades que podem ajudá-la a prosperar no mundo digital, que é orientado às imagens. E alguns especialistas em educação sugerem que os PCs e os games ainda estimulam a leitura de blogs e de guias de estratégia.
É certo que algumas das experiências combinando livros e jogos eletrônicos são pouco mais que truques de marketing. Mas os editores e escritores sugerem que alguns projetos podem estender as fronteiras da criatividade, ajudando a expandir a narrativa para além dos limites convencionais dos livros.
A premissa da série 39 Clues, da Scholastic, por exemplo, é a de que os jogadores online buscam algumas das pistas e com isso descobrem informações sobre os antecedentes de novos personagens, bem como textos e imagens sobre muitos assuntos, material que suplementa os romances e inevitavelmente requer alguma dose de leitura.
Uma recente pesquisa do Pew Internet & American Life Project constatou que 97% das crianças entre os 12 e os 17 anos jogam em seus computadores, consoles e aparelhos portáteis. Mas embora livros e videogames possam parecer muito distantes, há quem veja uma clara conexão. "Creio que jogadores e leitores estejam à procura da mesma coisa", disse Rick Riordan, autor da popular série de romances Percy Jackson and the Olympians e autor do primeiro volume da série 39 Clues da Scholastic. "Eles querem ser lançados a uma história intrigante, e participar dela como personagens".
Ainda assim, os leitores mais exigentes que comparam as narrativas dos livros às dos videogames consideram que falta muito aos jogos. Quando Jacob Bagley começou seu curso na Universidade Brown, se tornou adepto do World of Warcraft, um jogo online estabelecido em uma paisagem medieval, no qual jogadores cooperam para abater monstros e realizar tarefas.
Agora Bagley está no terceiro ano, mas em seus primeiros períodos na universidade se viciou a ponto de ocasionalmente largar o jantar no meio para voltar ao jogo. No entanto, a história nunca foi o atrativo. A narrativa e os personagens, ele diz, são simplistas demais, e isso o levou a abandonar o jogo em seu segundo ano na Brown. "Os videogames certamente não oferecem o mesmo grau de complexidade emocional e intelectual de um livro", ele afirmou.
Algumas pessoas argumentam que os videogames estão em estágio inicial de desenvolvimento e podem evoluir muito. "Não me surpreenderia que, em dez ou 20 anos, os videogames estejam criando universos de ficção tão complexos quanto os dos livros de Dickens ou Dostoiévski", disse Jay Parini, escritor e professor de inglês no Middlebury College.
Os escritores também começaram a adotar mais o ritmo e a perspectiva dos games. Quinn Clark, um jovem adepto dos videogames que vive em Vista, perto de San Diego, se deixou atrair pelo romance de Haarsma, The Softwire: Virus on Orbis 1, devido à semelhança com os seus jogos favoritos.
O narrador do romance é J. T., um menino de 13 anos que consegue se conectar mentalmente a um computador e combate alienígenas. O ponto de vista dele se assemelha ao adotado em um videogame. "Parecia que eu estava em Call of Duty 4", disse Quinn, um menino alto e magro de 12 anos, mencionando um popular videogame de combate.
Tradução: Paulo Migliacci ME
The New York Times
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